Fábrica do Rato I Uma referência na história da faiança portuguesa

Fábrica do Rato  I Uma referência na história da faiança portuguesa 

Há 250 anos era fundada em Lisboa a célebre Fábrica do Rato, que é uma referência na história da faiança portuguesa.

Na actualidade,essas peças podem ser observados nos grandes museus portugueses e no mercado de antiguidades.

O período do seu funcionamento, 1767 a 1836, marcou, com efeito, a renovação do sector, através do fabrico de peças de qualidade – influenciadas nas formas pela prataria francesa e nas cores pela porcelana da Companhia das Índias.

Na sua primeira e melhor fase, a fábrica, dirigida pelo italiano Tomás Brunetto, produziu, maioritariamente, bustos, estatuetas, potes, terrinas e aquários pintados com motivos naturalistas, em tons de branco, verde, amarelo e azul. A sua aceitação foi, porém, diminuta. A nobreza preferia as porcelanas provenientes da China, Inglaterra e França, e a burguesia considerava a produção nacional algo bizarra e fora de moda.

Ao desbarato

É antiga a tradição de menosprezarmos o que é nosso, sem nos darmos conta da injustiça, da autofagia que cometemos. O exemplo da Real Fábrica do Rato revela-se uma das maiores desatenções cometidas no campo da arte – campo onde elas se tornaram assíduas e, por vezes, dramáticas.

As encomendas efectuadas à fábrica, sempre diminutas, destinavam-se mais a agradar ao Marquês de Pombal do que gosto vigente. Deve-se, aliás, ao governante o apoio financeiro que permitiu assegurar a sobrevivência da manufactura, apesar dos prejuízos se acumularem, os armazéns se encherem, as vendas serem ao desbarato, e as críticas serem demolidoras.

A escolha de Sebastião de Almeida, em 1771, para mestre da manufactura, marcará o início de um rumo diferente. É lançada a produção, em quantidade, de objectos de forte consumo, como serviços de mesa e azulejos – então muito utilizados nos palácios, igrejas e prédios da cidade. Nos primeiros predominavam os temas naturalistas, nos segundos os temas figurativos.

O seu cromatismo mantém-se expressivo, com predomínio do azul, de que os painéis existentes no Paço Real de Caxias, no Palácio Pombal de Oeiras, e na Quinta dos Azulejos, em Lisboa, bem no Palácio de Queluz, são exemplares relevantes.

Domínio comercial

As dificuldades voltam, no entanto, a agravar-se. As faianças perdem, como consequência, qualidade. A fábrica procura apenas satisfazer o gosto popular. As encomendas da nobreza e burguesia rareiam.

O êxito comercial domina e, durante algum tempo, compensa – embora perverta a identidade cultural da manufactura.

Joaquim Milagres, nome destacado da cerâmica, tenta entre 1811 a 1817, inverter a situação e investir em peças que retomem a exigência inicial do projecto. De imediato, os prejuiços disparam e, com eles, a falência da Fábrica do Rato. 

Segue-se um longo período de esquecimento, apenas quebrada pelos estudos de José Queiroz em 1907, de Arthur de Sandão decádas mais tarde e, mais recentemente, de José Meco. Este historiador considera a faiança do Rato como a “mais brilhante realizada em Portugal desde o século XVI à actualidade”, tendo-lhe dedicado uma exposição no Museu da Cidade de Lisboa, em 1983.

Anteriormente, na mostra de Cerâmica Olissiponense, promovida pela Câmara Municipal de Lisboa, em 1936, o investigador Dom José Pessanha fez um esforço para revelar conjuntos inéditos de trabalhos realizados por artíficies do Rato.

Altos preços

Na actualidade, os museus de Arte Antiga, do Azulejo, da Cidade, em Lisboa; de Cerâmica, nas Caldas da Rainha; o Paço Ducal, em Vila Viçosa; e o museu da Fundação Maria Isabel Guerra Junqueiro, no Porto, preservam o conjunto do Rato de maior raridade.

As colecções de António Capucho, Maldonado de Freitas e António Espírito Santo, dispersas em leilões nos últimos anos, tinham igualmente exemplares de enorme valor.

Apaixonadas pelas manufacturas do Rato, a duquesa de Palmela e a condessa de Ficalho criaram, nos finais de 1800, a fábrica do Ratinho, localizada num pavilhão do Palácio Palmela, em Lisboa.Apesar da qualidade atingida, a sua duração seria fugaz.

O mercado de arte português “redescobriu” a faianças do Rato sobreviventes e valorizou-as de maneira ímpar. Um par de bancos de jardim, da colecção Palmela, atingiu  10 mil euros; um conjunto de quatros bustos representando as quatro estações chegou aos 40 mil euros; um par de cabos para colheres foi arrematado por 3 mil euros; uma tampa de selha foi vendida por 5 mil euros; um cesto de fruta subiu aos 5 mil euros; uma terrina foi transacionada por 27. 500 euros.

António Brás

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