Os Gatos I O Imperador dos Afectos
No passado dia 8 de Agosto, celebrou-se o Dia Mundial do Gato. Ou por outra, um dos dias Mundiais do Gato. Exactamente, leu bem. O gato, não fosse ele o que é, um imperador dos afectos, um galvanizador de paixões, um ser a quem atribuem 7 vidas, tem dois dias mundiais para ser homenageado.
É do conhecimento geral o apreço que a sociedade do Antigo Egipto nutria pelos pequenos felinos. Associados por vezes às próprias divindades, bem evidente na representação da deusa Bastet, com cabeça de gato, eles exerciam outro papel fundamental na sociedade já que assumiam um papel crucial no controlo de pragas de ratos, escorpiões e cobras. Podemos dizer claramente que eles eram “adorados como divindades, amados como animais de estimação, protegidos por lei e, por fim, mumificados, porque todos sentiam a sua falta após sua morte” como a revista UBER Magazine afirmava na sua edição de Outubro de 2009.
Apesar da proibição da saída dos gatos do império, o gato egípcio terá chegado à Grécia por volta do ano 2500 a.C, mas já antes a Europa conhecia o ronronar destes feiticeiros irresistíveis. Um túmulo datado de há 9500 anos foi descoberto na ilha mediterrânica do Chipre com um humano e um gato.
Apesar da ligação ancestral e das inegáveis qualidades e vantagens para o bem-estar da comunidade, nem sempre o gato gozou de boa fama e encontrou acolhimento afável. Alguns mitos e preconceitos, especialmente em relação aos gatos de pelagem preta, têm marcado a sua história e ditado vidas difíceis. E não se pense que isso foram apenas histórias passadas na Idade Média. Atualmente, por exemplo, em Timor-Leste ainda prevalece a generalizada crença de que os gatos lançam feitiços com os olhos e que, em algumas circunstâncias, provocam acidentes ou a morte. Se surge a necessidade de levar um busa (gato em tétum) a um dos dois veterinários existentes em Díli, isso pode constituir um verdadeiro problema e facilmente se transformar numa odisseia surreal porque a grande maioria das pessoas recusa-se a transportar um gato dentro de um veículo.
No Catar, que claramente apenas valoriza cavalos, camelos e falcões, a população felina é estimada entre 2 a 3 milhões de seres, o equivalente à população humana do país. Porém, o número apresentado não é nenhum indicador de que os gatos gozam de uma vida tranquila, antes pelo contrário. Os gatos no Catar são maltratados e abandonados com frequência quando adoecem.
Em contraste com estas duas realidades, temos a Turquia, um país dividido entre dois continentes, mas unido na mesma paixão pelos gatos. A sua maior cidade, Istambul, é um caso singular de feliz convivência entre humanos e felinos. Ali, os gatos são amados e felizes. Internacionalmente conhecida por motivos históricos e culturais, a fama de Istambul deve-se, actualmente, e em grande medida, à relação absolutamente ímpar que tem com os pequenos felinos. Um verdadeiro paraíso para todos os amantes destes peludos ronronantes de olhares profundos e sedutores. Circulando livremente pelas ruas, entram nos espaços públicos com perfeito domínio dos lugares e na serena convicção de que são amados.
De acordo com um estudo realizado em 54 países sobre as preferências entre cães e gatos como animais de estimação, a maior parte da Europa Ocidental, com exceção da Espanha, de Portugal e da Irlanda, está rendida aos encantos felinos. Já na América do Sul, os cães estão em vantagem na maioria dos países assim como em grande parte da Ásia com a América do norte a mostrar algum equilíbrio entre cães e gatos De acordo com o responsável pelo estudo, o Médio Oriente e parte da África, têm um apreço especial já de longa data por gatos.
As estatísticas indicam também que os gatos chegaram à actualidade, depois de terem sido adorados por povos da antiguidade e diabolizados por uma Europa medieval, como o 2º animal de companhia preferido no mundo inteiro uma realidade que apresenta sinais de crescimento. A relação dos gatos com o universo humano é tão especial que tem inspirado estudos que procuram entender, de forma mais aprofundada, esta ligação e todos parecem convergir no que empiricamente já muitos sabiam: conviver com gatos traduz-se num ganho incomensurável para a qualidade da vida humana.
De facto, exames ao cérebro demonstraram que estar perto de gatos ativa o córtex pré-frontal dos seus tutores provocando um efeito relaxante. Os benefícios emocionais conduzem, por seu turno, a outros como os que a Universidade norte-americana de Minnesota destacou quando concluiu que o convívio com gatos pode ajudar a reduzir o risco de um ataque cardíaco em 30%, precisamente por ajudarem a diminuir o stress.
O apoio a pessoas em situação vulnerável tem, aliás, sido referido nos estudos focados neste binómio gato/humano. Há já algum tempo que têm sido implementados projetos de apoio a grupos especiais com a colaboração dos pequenos felinos. Visitas domiciliares de gatos proporcionando aos idosos e doentes o prazer delicioso de um gato no colo ou a adopção dos animais pelas instituições são alguns exemplos. Afagar o pêlo macio e sentir a resposta feliz dos bichanos no seu amassar das patinhas e no ronronar fervilhante é das experiências mais gratificantes tendo sido provado que o cérebro humano reage ao ronronar libertando aquela que é conhecida como a hormona da felicidade, a serotonina. Por todos os motivos já apresentados e também por promoverem um desenvolvimento emocional equilibrado, reforçando competências de empatia e responsabilidade, é também aconselhável o convívio das crianças com os patudos de miado ronroneiro.
Não é, pois, por acaso, que o gato tem também conquistado um lugar na sua função de terapeuta a par do que já tem vindo a acontecer com os cães e cavalos, revelando-se um colaborar de sucesso em casos de ansiedade, depressão e stresse pós-traumático.
“Deus criou o gato, a fim de dar ao homem o prazer de acariciar o tigre”. Esta frase de um autor desconhecido e amplamente divulgada, fica aquém do que os que amam os gatos sentem. Especialmente dos que cresceram e sempre viveram com eles e sabe bem que, na sua individualidade, cada um foi muito especial.
Deus criou o gato para o Homem ser feliz e não apenas para poder acariciar um tigre. Os que gostam de gatos, gostam exactamente por aquilo que são: gatos, e não tigres em ponto pequeno. Lindos, expressivos, encantadores, misteriosos, plenos de personalidade, generosos de ternura, mas ciosos do seu espaço, do seu tempo e da sua vontade. Tão independentes e deliciosamente engraçados que nos sentimos sempre honrados quando nos saltam para o colo.
Na relação entre humano e gato não há posse, mas respeito e amor mútuo.
Paula Timóteo