Cinco séculos de teatro I Uma arte efémera

Cinco séculos de teatro I Uma arte efémera

A estreia, no século XVI, do Auto do Vaqueiro marcou, como se sabe, o surgimento do teatro português. A peça foi escrita em castelhano por Gil Vicente para comemorar o nascimento do futuro Rei D. João III, tendo-se estreado na presença da corte. 

A primeira obra do genial dramaturgo (e ourives, segundo alguns historiadores foi o autor da célebre Custódia de Belém, obra-prima da nossa ourivesária) foi, no entanto, Auto Pastoril. A afluência do público aos seus espectáculos (realizados, posteriormente, em espaços abertos) tornou-se enorme. A sua produção multiplicou-se. Dela sobressaem os autos das Almas, dos Reis Magos e da Sibila Cassandra – sinalizadoras do início do Renascimento.

Uma exposiçao patente no Museu do Teatro põe em confronto o genial Gil Vicente e dramaturgos espanhóis seus contemporâneos – caso de Juan del Encina, Luca Fernández, Bartoomeu de Torres Navarro, Diego Sánches de Badajoz e Sebastian de Hoozco.

300 mil peças

Aberto em 1985, o Museu do Teatro deve-se à perseverança de Vítor Pavão dos Santos. Ao longo dos últimos 39 anos foram reunidas mais de 300 mil peças, o que o torna uma das instituições mais importantes a nível mundial. 

A quase totalidade do seu recheio foi doada por grandes vultos do espectáculo e pelo públicoanónimo e interessado. Sobressaem, especialmente, trajes de cena de Eduardo Brazão, Amélia Rey Colaço e de Amália Rodrigues, correspondência de Amélia Rey Colaço, manuscritos de Alfredo Cortez e D. João da Câmara, conjuntos documentais de Raul Solnado e Eugénio Salvador, bibliotecas de Henrique Santana e Mário Viegas, trajes desenhados por Almada Negreiros e Lucien Donnat, figurinos de Nuno Corte-Real , Lucien Donnat e José de Guimarães, caricaturas de Amarelhe e Stuart Carvalhais, retratos de Maria Adelaide Lima Cruz e José Viana, esculturas de Joaquim Valente e Júlio de Sousa,  jóias de cena usadas por Palmira Bastos e Amélia Rey Colaço, teatros em miniatura dos séculos XVIII ao XX e milhares de livros (a mais importante biblioteca do género entre nós), fotografias, postais e programas dos séculos XIX ao XX. Um dos objectos mais espectaculares é a célebre cadeira, em talha e veludo vermelho, onde Almeida Garrett escreveu, durante os dias em que esteve retido em casa, com uma perna partida, Frei Luís de Sousa.

O Museu do Teatro permite fazer uma retrospectiva das artes do palco no nosso País, em que existiram, desde Gil Vicente, mais de mil actores, dramaturgos e encenadores.

O vastíssimo espólio guardado por aquela instituição, permite efectuar rotatividades regulares do seu notável património. 

A quase totalidade do acervo data do século XIX aos nossos dias.

Multiplicam-se companhias

No período oitocentista verifica-se uma revolução no sector teatral. Multiplicam-se as companhias organizadas, sucedem-se construções de espaços (entre os quais os teatros D. Maria II e da Trindade, em Lisboa), e alguns intérpretes e autores atingem êxitos estrondosos.

A partir de então passa a haver documentação preciosa para se conhecer o desenvolvimento das artes cénicas. 

Nos últimos 100 anos, o modernismo invadiu os palcos, seguindo a estética europeia. Pintores (como Almada Negreiros, Domingos Rebello, Eduardo Malta e José de Guimarães), dramaturgos (como D. João da Câmara, Bernardo Santareno, Luiz Francisco Rebello e Natália Correia), actores (como Palmira Bastos, Amélia Rey Colaço, Carlos Daniel e Diogo Infante) e encenadores (como Robles Monteiro, Carlos Avilez, João Lourenço e Carlos Wallenstein) marcam essa evolução.

O Museu do Teatro revela-se um espaço vivo, a instituição mantêm viva a arte teatral – uma arte éfemera.

António Brás

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