Importante doação de obras de arte ao Estado
O renovado circuito museológico do Palácio Nacional de Sintra recebeu uma importante doação de Carin Bramão, efectuada em nome do marido Luís Bramão.
Trata-se da mais importante doação recebida pelo Estado nos últimos anos.
Este espólio veio enriquecer o acervo de Sintra e colmatar lacunas no nosso património.
Luís Bramão foi a maior coleccionador português de arte italiana entre nós. Vivia no Monte Estoril, num apartamento onde a pintura, o mobiliário e os têxteis estavam representados desde os séculos XIII ao XVIII. “Quando fui para Itália trabalhar na FAO apaixonei-me pela arte daquele país e comecei a adquirir obras das escolas de Florença, de Veneza, de Siena”, disse-nos: “Na altura coordenava uma equipa de 300 cientistas, espalhados pelos cinco continentes, de que resultou a primeira e única carta dos solos do mundo”.
Formado em Agronomia, tirou uma pós-graduação na Universidade de Cornell, mas ao rebentar a II Guerra Mundial regressou a Lisboa. Partiu para a América em 1947, onde se tornou investigador na Fundação Rockefeller.
Em 1954, Luís Bramão fixou-se em Itália e, para aliviar a intensa vida profissional, encontrou na arte um hobby: “Os meus tempos livres eram dedicados a percorrer os antiquários e as bibliotecas porque um coleccionador deve estar bem informado daquilo que compra”.
O apartamento onde vivia ficou repleto de preciosidades, levando-o a comprar uma casa de férias: “Encontrei um castelo do século X, nos arredores de Roma, que recuperei e decorei apenas com arte italiana”.
Durante os 20 anos que ali esteve interessou-se pelas culturas etrusca, de Villanova (idade do ferro), gregas, romanas e medievais. A sua colecção viria a ser doada nos anos 90 ao Museu Nacional de Arqueologia de Lisboa.
Em 1964, Luís Bramão regressou a Portugal e instalou-se em São Brás do Alportel, onde edificou uma casa inspirada nas vilas florentinas, com uma valiosa colecção de arte. O Rei Humberto, exilado em Cascais, na primeira vez que visitou o palacete exclamou emocionado: “Parece que voltei a Triento”. Recorde-se que o ex-monarca passara em Triento, segundo repetia, “o melhor período” da sua vida.
Nos anos 90, Luís fixou-se no Estoril transferindo para ali todo o seu vasto património. Neste sobressaiam pinturas do século XIII ao XVIII, especialmente uma “A Virgem com o Menino” de Cesaro de Sesto e um “São João Baptista“ de Francisco Francia, cadeiras italianas do século XVI, uma arca do século XVII, um contador italiano ou granadino datado de 1574, uma cómoda veneziana do século XVIII, tocheiros e castiçais venezianos góticos, veludos e brocados quinhentistas. Completavam o acervo pratos hispano-árabes dos séculos XV/XVIII (oferecidos por Gulbenkian à filha), tapetes do Caúcaso que abrangem um período cronológico dos séculos XV ao XVIII e um “Busto de Jovem” florentino do século XVI. “Nunca foi adepto da quantidade, mas sim da qualidade, quantas mais raras são as peças maior e o prazer em possui-las”.
Em relação á arte portuguesa, Luís Bramão destacava as pratas. “Gosto das peças do século XVIII e da primeira metade do XIX, especialmente as de Firmo da Costa, um ourives extraordinário”.
Parte das suas colecções de arte são doadas pela viúva, Karin Bramão, em 2009, ao Palácio Nacional de Sintra, a maior incorporação que o monumento jamais teve.
Luís Bramão desapareceu a 8 de Novembro de 2007, aos 98 anos.
Palácio de Sintra na actualidade
Nos interiores do mais antiga residência-real portuguesa podemos observar mobiliário português dos séculos XVI ao XIX, tapetes persas, colchas e contadores indo-portugueses, diversos barguenos, pinturas retratando reis e príncipes portugueses, óleos de naturezas-mortas e temas religiosos, esculturas, faianças portuguesas, porcelanas da Companhia das Índias. Numa sala especial podemos contemplar um notável conjunto de faianças hispano-árabes, bem como algum mobiliário e pinturas – destacando-se um retrato da família Visconti – da colecção de D. Maria Pia.
Na actualidade o Palácio Nacional de Sintra mostra-se um espaço dinâmico fora do comum dentro da museologia portuguesa. A empresa Parques de Sintra/Monte da Lua têm vindo a desenvolver um trabalho de grande relevância a todos os níveis. O visitante atento observa um monumento cuja valorização, preservação e estudo do acervo têm sido fulcrais.
O enriquecimento do património tem continuado, recentemente foi adquirida a cama dos duques de Cadaval. Trata-se de um leito seiscentista em ébano, guarnecido a bronze, prata branca e prata dourada cinzelada, sendo uma peça de extraordinária riqueza e sumptuosidade. No século XX foi vendida pela casa-ducal, secularmente ligada a Sintra, e em 1963 integrou o leilão da colecção Augusto de Athayde. Trata-se de um móveis português mais importantes do século XVII e pertenceu a Pedro Branco, da VOC Antiguidades de Lisboa.
Outra aquisição de grande relevo foi uma salva manuelina de enorme raridade.
O PNS chegou aos nossos dias bem conservado, com um tratamento museológico extremamente bem conseguido – que foi bastante melhorado nos últimos anos.
O esforço foi recompensado pelo interesse dos visitantes, dos estudiosos e pela doação de Carin Bramão em homenagem ao seu falecido marido.
Este espólio veio enriquecer o acervo de Sintra e colmatar lacunas no nosso património.
António Brás