René Lalique I O Inventor da Joalharia Moderna
Até 3 de Novembro do ano em curso, pode-se admirar no Museu Lalique de Wingen-sur-Moder, na Alsácia, mais de 100 peças excepcionais, que mostram como o mestre René Lalique renovou a arte da joalharia no final do século XIX. Os visitantes admirar e descobrir a enorme diversidade de criações, como, pentes, anéis, gargantilhas, alfinetes de chapéu, etc. – até aos materiais preferidos por Lalique e às suas fontes de inspiração.
Nas palavras de Henri Clouzot, “René Lalique foi um dos maiores artistas […], e o único capaz de lançar uma onda de nova beleza sobre o mundo. Até então, a joalharia era sinónimo de ouro, prata, pérolas, diamantes e pedras preciosas. […] Desafiando totalmente a tradição, reabilitou as pedras mais humildes até então desprezadas, como o corindo, o ónix e a sardónica, o jade, a ágata e a cornalina, o jaspe, o coral e a opala. Criou diademas, pentes, alfinetes, pendentes, anéis e pulseiras em que a criatividade e a excelência do trabalho artesanal se sobrepõem ao valor intrínseco dos materiais. Flores e frutos, insectos, aves, peixes e répteis fazem parte do panteão de motivos que Lalique recriou, adaptando-os às técnicas do joalheiro. O seu génio era tal que nenhum dos muitos que tentaram copiar Lalique se aproximou do seu nível de excelência. No entanto, o prestígio da joalharia tradicional com pedras preciosas depressa recuperou o seu estatuto. “
A exposição: “René Lalique, O Inventor da Joalharia Moderna,” destaca a contribuição do artista para a arte da joalharia no período da Arte Nova. A mostra apresenta as “parures” de Lalique tal como eram usadas no espírito da moda da “Belle Epoque”, realçando o seu estatuto de obras de arte, a sua dimensão arquitectónica e a sua atenção escrupulosa aos pormenores. O evento aborda os processos criativos e de fabrico inspirados no fértil espírito de moda de Lalique, os materiais que utilizava, a importância que atribuía ao desenho e ao volume, e toda a panóplia das suas criações. A exposição reflecte as palavras de André Beaunier: “A sua obra é totalmente nova, livre de todas as influências exteriores”, e de Emile Sedeyn: “O génio de Lalique é tal que as suas criações são eternas, mas ele infunde-lhes uma ponta de modernidade. “
A Exposição
Numerosas exposições, em cidades como Paris, Lisboa, Nova Iorque e Tóquio, prestaram homenagem ao génio criativo do mestre joalheiro René Lalique.
Acerca da mostra, Véronique Brumm–Schaich, directora do Museu Lalique, afirmou: ”Foi importante criar uma nova mostra sobre este tema central, em primeiro lugar, para mostrar o talento extraordinário que as jóias de Lalique revelam e para além disso estas peças continuam a ser totalmente fascinantes mais de um século após a sua criação. Em segundo lugar, as jóias de Lalique dão uma visão particularmente eloquente da sua imaginação e da sua capacidade única de criar obras de arte totais. E, finalmente, porque os visitantes podem admirar uma exposição deste género desde a abertura do museu em 2011”.
“Porquê esperar até agora? Porque em vez de propor apenas mais uma exposição, quis reunir as peças mais excepcionais de Lalique e mostrá-las sob uma nova luz. Como directora e conservadora do museu, tenho o privilégio de poder estudar e manusear as jóias de perto, o que me permite observar o sentido de pormenor de Lalique e a qualidade e meticulosidade do seu trabalho. O ponto de partida foi o desejo de partilhar esta emoção com os nossos visitantes, embora, por razões óbvias de segurança e conservação, não fosse possível o contacto directo com as peças expostas; as fotografias e o vídeo foram a alternativa óbvia.
É evidente que esta abordagem exigia um olhar atento ao processo criativo e às técnicas de produção, incluindo as fontes de inspiração de René Lalique, a importância que atribuía ao desenho, a sua escolha de materiais, a atenção meticulosa ao mais ínfimo pormenor e a forma como determinados motivos eram utilizados em diferentes objectos.
E, finalmente, outro tema que me ocupa há muitos anos é a forma como se usavam as diferentes peças de joalharia, como a gargantilha, os botões de punho e os alfinetes de gravata. Vejo o papel da joalharia na moda como uma outra forma de explorar um período da história.
O título da exposição é uma citação de Emile Gallé, outro grande nome da era Art Nouveau, que prestou pela primeira vez homenagem ao génio criativo de René Lalique em 1897. Os seus contemporâneos foram praticamente unânimes no reconhecimento do talento de Lalique, daí as numerosas referências aos críticos de arte da época nos textos que documentam a exposição,” disse Véronique Brumm-Schaich.
Moda e joalharia
A silhueta feminina da Belle Epoque, inspirada em costureiros como Charles-Fréderic Worth, Jacques Doucet e Paul Poiret, caracterizava-se por uma cintura estreita, suavizada com nuvens de musselina, drapeada com cetins pesados e rendas fluidas. A revista “L’art et la Mode” sublinhava, na década de 1890, que “A moda é usar montes de jóias”, ao ponto de os costureiros e modistas da época optarem por armazenar uma selecção de peças. Mesmo os objectos que até então eram considerados meros acessórios, como os alfinetes de cabelo e de chapéu, os pentes e as fivelas de cintos, começaram a ser vistos como potenciais jóias. As gargantilhas, montadas em fitas ou em várias filas de pérolas, continuam a ser as grandes favoritas, enquanto os colares compridos se tornam extremamente extravagantes; os relógios, os estojos de pó de arroz e as “lorgnettes” eram pendurados nos cintos ou nos colares e os diademas eram reservados para as noites de gala.
A silhueta masculina era escura e discreta, sendo o elemento de luxo proporcionado pela qualidade dos tecidos, mas também por acessórios como botões de punho, alfinetes de gravata, relógios de ouro e pegas de bengala esculpidas.
Esta panóplia de ornamentos em voga inspirou René Lalique a propor novas versões e o seu genro, Paul Burty Haviland, sublinhou que a influência de Lalique “era vista como revolucionária”. Revolucionária? É possível. Rebelde, certamente: a sua posição era contra o culto das pedras preciosas pelo seu valor financeiro, contra o uso de notas de banco ao pescoço, nos dedos e nos pulsos. “O conservador do Museu de Cluny, Edmond Haraucourt, acrescenta que “esta atitude não era suscetível de atrair uma clientela de classe alta e os primeiros anos foram difíceis. Mas o homem que domava as pedras preciosas não cedeu; as pedras cederam primeiro, seguidas das senhoras, seguidas dos maridos, que cederam às mulheres, e a moda que reinava há séculos aceitou a reforma. A Exposição Universal de 1900 foi um triunfo mundial para Lalique.”
Theresa Beco de Lobo