Com origem no verbo latino augere, que significa “aumentar” ou “engrandecer” Agosto foi o nome escolhido para o 6º mês do antigo calendário romano (que começava em Março) de forma a homenagear as vitórias de Júlio César Augusto, o 1º imperador de Roma, que governou de 27 a.C a 14 d.C. Estávamos no ano 8 a.C quando o Senado romano mudou o nome do mês de “Sextilis” para “Augustus”, porque teria sido nesse mês que Augusto havia entrado pela primeira vez em Roma como cônsul além de corresponder ao mês em que o imperador havia alcançado mais vitórias. Só havia um problema: o mês não podia ter menos dias que o anterior cujo nome homenageava Júlio César e por isso os dois meses acabaram por ter 31 dias.
É pois, uma feliz coincidência que o mês, cujo nome nos remete para conceitos de grandeza e consagração, seja o mês que tradicionalmente mais portugueses escolhem (ou são obrigados pelas entidades patronais e serviços públicos) para gozarem um período de férias. Ainda que recentemente se tenha vindo a instalar o hábito de férias repartidas ao longo do ano (para quem pode), a interrupção lectiva e o fecho de escolas, creches e centros de estudos, empurram, inevitavelmente, muitas famílias para terem férias no mês mais quente do ano.
Nesta altura, com excepção dos alunos que fazem exames na 2ª época, as “contas” com o ano lectivo anterior estão encerradas e avizinha-se já o início do próximo.
Sendo este um tempo que apela à praia, preguiça e passeio, é também um tempo mais elástico e em que finalmente, ao fim de largos meses, a família se encontra reunida e a partilhar não apenas espaço, mas tempo em simultâneo numa convivência que nem sempre é pacífica, mas que certamente somará recordações que condimentarão docemente o resto do ano. A proximidade e uma maior plasticidade de horários e compromissos, também acaba por representar uma oportunidade de reflexão sobre escolhas, rotinas, conflitos. Boas ou más, o que importa é perceber que ao longo de um ano pais e filhos coabitaram em decisões que influenciaram uns e outros. E nem sempre as coisas terão corrido da melhor forma nomeadamente na escola ou nas actividades extracurriculares como o desporto, a música, a dança…
O tempo de maior descompressão também representa uma oportunidade para afinarmos a nossa capacidade de escutar. A escuta atenta, com controlo emocional e isenta de ideias já pré definidas é um exercício exigente e hoje temos por vezes muito pouca lucidez parental e pouca musculatura emocional por parte das crianças e jovens. Mas valerá a pena pousar por instantes os telemóveis, esquecer os tik toks, os instagrams, facebooks e reels. Bloquear as notificações, silenciar as interferências acessórias e talvez, talvez valha a pena mobilizar afectos sem pieguice, mas com a profundidade de um pensamento estruturado e reflectido.
Reconectar as ligações perdidas, reavaliar prioridades que na espuma dos dias acabam por nos sonegar vida e tempo e fazer esse exercício em família. Afinal, que balanço fazemos do ano de trabalho? Que ganhos foram alcançados? O que somámos ao nosso conhecimento? O que sabemos hoje que não sonhávamos antes? Que livros foram lidos? E o que fizemos de relevante por alguém que não nós próprios? Que plano temos para o próximo ano?
Dizem que as perguntas são mais importantes que as respostas e que o caminho mais relevante que a meta. Não concordando em absoluto, a verdade é que sem o questionamento e as viagens que fazemos dentro de nós próprios, dificilmente nos tornaremos menos ignorantes.
Actualmente os educadores parentais, têm a tentação de seguir um tipo de narrativa que resulta, na prática numa desresponsabilização das crianças e jovens de qualquer coisa que corra menos bem além de uma postura que, em nome do “respeito que os filhos nos merecem”, vai no sentido de considerar que as decisões têm de ser sempre negociadas com eles, não devendo haver imposição de nada e pedir desculpa constantemente de tudo. As modas atingem também os postulados dos especialistas e por vezes, na insegurança que qualquer parentalidade possui, os pais acabam por seguir mais facilmente os guiões editoriais do que ouvir as vozes sábias da experiência. Diríamos que, e mobilizando um ditado português “nem tanto ao mar nem tanto à terra”. Ouvir uns e ler outros para confiando também na capacidade individual de identificar o sensato, fazer escolhas, talvez seja esse o segredo.
As férias sendo um tempo de maior descontração e onde por vezes se concentram vários elementos da família é pois uma oportunidade de, com serenidade e amor, escutarmo-nos vagarosamente, sem pressa. Criar memórias que vão salgar de saudade o futuro, mas que serão sempre o refúgio seguro e benévolo para onde regressamos com um sorriso é a grande conquista destas épocas. Dialogarmos com afecto e sem a acidez da pressa dos dias deve fazer parte das rotinas e por vezes a conversa, que visa a tal reconexão, pode surgir a partir de um debate sobre um filme visto, um livro lido, um episódio observado na praia ou num passeio, ou até no âmbito de um jogo partilhado. O que deve mesmo acontecer nas férias é um fortalecimento de laços, a recuperação de um diálogo menos condicionado pela pressa, mas também menos refém do medo de desagradar aos filhos porque os filhos precisam de pais que sejam o seu porto seguro o seu farol e não pais complacentes demissionários do seu papel regulador.
Façamos do mês que tomou o nome da grandeza um mês de felicidade, mas igualmente de crescimento pessoal.
Paula Timóteo