Winnie the Pooh, o ursinho de voz doce e olhar ingénuo, tem encantado gerações não apenas durante a infância, mas mesmo depois desse período dourado. Quantos de nós, já adultos, não continuam a desejar o regresso ao bosque dos Cem Acres, encontrar-se com Christopher Robin e com ele ir ao encontro do encantador ursinho guloso de mel, ouvir os queixumes de Ló, o burro melancólico, receber conselhos da coruja, saltar loucamente com o tigre?
Tal como as histórias do ursinho feliz, cujo autor se inspirou nos bonecos do filho, muitas outras que apresentam os animais como protagonistas, ocupam um espaço importante no imaginário da infância de cada um de nós. Livros de histórias recheadas de alegria e ensinamentos fazem parte da vida de muitas crianças (infelizmente ainda negados a muitas outras) ajudando-as a sorrir e a adormecer nos braços de uma fantasia deliciosa.
Mas os benefícios do convívio com animais ao nível do desenvolvimento integral das crianças, vai muito além deste milagre poético em asas de condor por reinos mágicos onde cães sábios e gatos de botas altas nos ensinam tanto a ser crianças mais atentas e bondosas como adultos mais esquecidos das pedrinhas que nos pesam na alma. Se já sabíamos de forma empírica, agora a ciência veio confirmar que o convívio real e presencial com animais, desde a mais tenra idade, promove não apenas um bem estar emocional como se revela determinante na resolução de problemas mais complexos. Para além dos aspectos mais abstractos, o convívio de crianças com animais exerce também efeitos altamente positivos no seu desenvolvimento cognitivo já que ao estabelecerem um relacionamento significativo com o seu amigo de 4 patas são ajudados a entender de forma natural e carinhosa aquele que é diferente, que tem uma linguagem diferente, um aspecto diferente e necessidades diferentes, mas que no amor e na dor física e afectiva é similar. Por outro lado, cuidar de um animal pode fornecer lições valiosas às crianças sobre responsabilidade, empatia, disciplina, atenção sobre o outro.
Como afirma Megan Mueller, professora de interação entre seres humanos e animais, da Universidade Tufts, nos Estados Unidos “É muito importante, especialmente para as crianças mais jovens, aprender que o ponto de vista de alguém pode ser diferente do dela próprio. Talvez seja uma lição mais fácil de aprender com um animal do que, digamos, com um irmão ou colega.” Cuidar de animais é assim associado a níveis mais altos de empatia porque as crianças tornam-se mais capazes de interpretar sentimentos e necessidades de outro ser. E este aspecto ainda se torna mais relevante quando falamos de crianças com autismo porque lhes reduz o stresse, melhora os níveis de confiança e, desta forma, ajuda-os a criar outras oportunidades de relacionamentos.
As conclusões a que os cientistas de comportamento social chegaram focam ainda outros aspectos essenciais a um crescimento consistente harmonioso e saudável já que as brincadeiras e cuidados que as crianças oferecem aos seus “irmãos” patudos exercem um impacto positivo na capacidade de concentração das crianças o que, se tivermos em conta uma certa “epidemia” do chamado déficit de atenção, é de acrescida importância. Estudos observaram também que as crianças cometiam menos erros em tarefas de classificação de objetos e também apresentavam melhor prestação em tarefas de memória na presença de um cão na mesma sala.
Hayley Christian, pesquisadora e professora da Escola de Saúde Global e da População da Universidade da Austrália Ocidental em Perth, realizou um estudo com 4 mil crianças entre os cinco e os sete anos de idade e, com os seus colegas, descobriu que existe uma relação entre ter um animal de estimação e melhor comportamento social nomeadamente no relacionamento com os seus amigos e pares na escola. Num outro estudo, ficou concluído que crianças entre os dois e cinco anos de idade que tinham um cão na família eram mais ativas, passavam menos tempo frente à televisão e dormiam mais e melhor, em média, que as crianças que não tinham animais de estimação. A actividade física associada ao facto de brincarem e irem passear com o cão seriam os factores essenciais para produzir a diferença.
Num outro estudo publicado em 2021, e excluindo o efeito da situação socioeconômica, os pesquisadores observaram que as crianças que se dedicavam regularmente a atividades físicas relacionadas com cães apresentaram melhores resultados de desenvolvimento cognitivo.
“Podemos realmente afirmar que ter animais de estimação e interagir com eles ao longo do tempo no início da infância parece ser a causa desses benefícios adicionais, em termos do desenvolvimento socioemocional [das crianças]”, afirmou Christian, que também é pesquisadora sénior do instituto Telethon Kids.
A idade das crianças, conjugada com outros factores, também deve ser tida em linha de conta quando se decide adoptar um companheiro. Estudos relevam que crianças com idades entre os seis e dez anos desenvolvem ligações mais fortes com animais mais parecidos com os seres humanos, como cães e gatos, do que com espécies biologicamente mais distantes, como pássaros e peixes. Mas crianças mais velhas, com 11 a 14 anos de idade, relatam ter o mesmo tipo de conexão com as espécies com relação mais distante como lagartos e hamsteres.
Porém, é importante perceber que a adopção de um animal vem acompanhada de grande responsabilidade por parte de toda a família e deve ter em conta não apenas os possíveis ganhos emocionais, sociais, cognitivos e motores, das crianças em particular, mas também dos adultos. É absolutamente obrigatório perceber que o animal que se acolhe em casa deve ser encarado como um elemento da família a quem se deve dedicar todo o investimento que ele necessitar. Por outro lado, um cão, gato, ou qualquer outro animal não tem nenhuma varinha de condão nem é um fazedor de magia. Existem questões que devem ser colocadas em equação quando se trata de entender as razões para determinados comportamentos e nesse âmbito deve-se reflectir sobre a alimentação, horários, rotinas, relacionamentos sociais a que a criança está sujeita.
Num número em que dedicámos especial destaque aos animais, fruto do dia 4 de Outubro ser a eles consagrado, o espaço habitualmente dedicado à Educação não podia deixar de destacar toda uma série de razões para que se acolha um amigo de outra espécie. Os animais que integram as famílias tornam-se tão importantes na vida das crianças que chegam a serem eles os seus confidentes preferidos e mais fiáveis.
Paula Timoteo