Educação I A Língua Portuguesa em Timor-Leste. Que futuro?
Timor-Leste, terra do sol nascente, é o único país asiático que tem o Português como língua oficial, a par do Tétum, mas raros são os que falam ou entendem português. Os 24 anos de ocupação indonésia que se traduziram, entre muitas outras dimensões, na proibição do uso do português e na imposição do bahasa, língua indonésia, teve consequências devastadoras para a preservação da língua portuguesa. No entanto, e apesar de décadas de clandestinidade, o Português sobreviveu e é hoje encarado na sociedade timorense, de forma consensual, como um património identitário da nação e essencial ao enriquecimento vocabular e estrutural do Tétum que é a língua materna mais abrangente neste país que conta ainda com cerca de 30 outras línguas maternas.
Embora o hino e a Constituição estejam escritos em português não é esta a língua que se ouve no país e não foram apenas os 24 anos de ocupação indonésia que desferiram golpes mortais no uso do português. Aquando da invasão em 1975, a maioria dos poucos portugueses que em Timor viviam, encontrava-se em Díli tornando a presença portuguesa no território incipiente. Para além deste facto, durante todo o período colonial, Timor-Leste, localizado quase nas antípodas de Portugal, não beneficiou nem de uma presença forte nem de um investimento consistente nomeadamente ao nível da educação escolar, mesmo numa época recente, quando esta realidade se tornou menos compreensível.
Após a restauração da independência (falamos de restauração porque a 28 Novembro de 1975 Timor-Leste proclamou a sua independência interrompida, a partir de 7 de dezembro do mesmo ano, durante a ocupação indonésia), Portugal iniciou um caminho de cooperação com as instituições governamentais timorenses estabelecendo protocolos na área da Educação e Formação que têm dado lentamente os seus frutos.
Um dos projetos mais conhecidos e de reconhecido mérito é o dos Centros de Aprendizagem e Formação Escolar, CAFE. Distribuídos pelos 13 municípios são escolas públicas onde professores portugueses com turmas atribuídas desde o pré-escolar ao 12º ano trabalham em simultâneo com os seus pares timorenses a quem dão formação em contexto de trabalho. Os resultados escolares obtidos pelos alunos são a prova indiscutível do sucesso deste programa.
Outro dos projetos que tem vindo a assumir um papel relevante é o Consultório de Língua para Jornalistas. Sabendo da importância que os sectores ligados à comunicação social e /ou institucional assumem na divulgação da cultura e da língua num país, este projeto tem tido como missão melhorar as competências de língua portuguesa e de jornalismo dirigindo-se a jornalistas e profissionais do Governo ligados à comunicação (assessores de imprensa, oficiais de comunicação ou tradutores). Desde 2016, quando só existia informação em português na Rádio e Televisão (RTTL), que este projeto bilateral entre Portugal e Timor-Leste tem crescido com forte adesão e procura dos profissionais. Resultado deste êxito é o facto de, em 2023, haver já cinco órgãos de comunicação social timorense que escrevem em português além de ter surgido, em Janeiro deste ano, o primeiro jornal online totalmente em língua portuguesa, o Diligente.
“O objetivo geral do projeto é capacitar os profissionais de comunicação social timorenses para a transmissão de informação fidedigna ao público em língua portuguesa, contribuindo para o aumento da literacia mediática, económico-financeira e jurídica e para o fomento do conhecimento geral da população.” Pode ler-se numa das publicações do Diligente dedicada ao projeto.
Porém, apesar de todo o esforço no sector educativo e de Comunicação, nas ruas de Díli e nos caminhos que rasgam montanhas e atravessam Timor-Leste continuamos a não ouvir uma palavra de Português. Nos locais de comércio os funcionários de sorriso aberto e genuína simpatia fazem o que podem para entender os malaes portugueses e sentimos um afecto e carinho que nem sabemos bem se somos dele merecedores, mas é sempre muito difícil uma comunicação eficaz. Os gestos e uma ou outra palavra de Tétum que conheçamos faz a diferença e conduz-nos ao momento epifânico do entendimento mútuo.
Há de facto um longo caminho a percorrer e custa sentir que falta, da parte de Portugal, uma visão estratégica mais abrangente, fluída e menos condicionada por mecanismos burocráticos. As escolas CAFE são uma referência, mas abrangem uma percentagem muito reduzida de alunos timorenses e, por isso, se desejamos efetivamente fortalecer o setor educativo e a formação do Português ao longo da escolaridade e a partir do pré- escolar, é urgente um reforço dos recursos para expandir este modelo.
Por outro lado, uma forte aposta no áudio visual com conteúdos apelativos, um investimento sério num acervo bibliográfico descentralizado e de fácil acesso composto não apenas de obras técnicas actualizadas, mas de boa literatura infantil-juvenil-adulta, uma divulgação da música em português, que não se está a fazer, são focagens estratégias absolutamente vitais se quisermos, de facto e não apenas no papel, salvar a presença do português neste canto do planeta. A RTP Internacional oferece o que nem um português quer muitas vezes ver e por isso a RTP necessita rever a sua política mediática. Conquistar públicos de biografia cultural distinta passa por produzir conteúdos diversificados e pensados para o universo a quem se destinam.
A Educação linguística faz-se a vários níveis e recorrendo a mecanismos e recursos apelativos. Não basta ter sido criada uma CPLP. Portugal deve, de forma mais objectiva, comprometida e séria assumir um papel relevante na divulgação da língua portuguesa.
Terá a língua portuguesa “Pés para andar”?
Ana Paula Timóteo