Jóias de Palco da “Comédie Française” I Em Paris
Este Outono, A MODA&MODA foi à inauguração no dia 6 de Outubro de 2023 da L’École des Arts Joailliers, em Paris. A L’ÉCOLE abrirá as portas ao mundo da joalharia nesta cidade! Impulsionada pelo entusiasmo do público, a L’École des Arts Joailliers alargou o seu âmbito com uma nova localização num palácio do século XVIII nos Grands Boulevards de Paris. Este edifício foi registado como monumento histórico, onde local inclui um grande espaço de exposição, uma livraria e uma biblioteca inteiramente dedicada ao mundo da joalharia.
A L’École des Arts Joailliers foi fundada há mais de dez anos com o apoio da Van Cleef & Arpels com o objetivo de partilhar a cultura das jóias em França e em todo o mundo. Para além das suas duas instalações em Paris, a L’ÉCOLE está presente em muitas cidades, incluindo Nova Iorque e Tóquio, onde organiza sessões itinerantes de uma semana – e Hong Kong, onde tem um campus permanente. Estão previstas duas novas sedes em Xangai e no Dubai. L’ÉCOLE oferece cursos, conferências, workshops para crianças e publicações que exploram a joalharia, a sua história e savoir-faire, e a gemologia. A L’ÉCOLE organiza em colaboração com museus e coleccionadores privados, as exposições temporárias destinando-se a um público tão vasto quanto possível – especialistas e principiantes – razão pela qual a entrada nestes eventos e nos respectivos guias de visitantes continua a ser gratuita.
O Hôtel de Mercy-Argenteau
Uma das mais antigas casas particulares dos Grands Boulevards, o Hôtel de Mercy-Argenteau estende a sua fachada de pedra neoclássica discreta ao longo da rua. Entre as poucas ainda existentes, o palácio está classificado entre os edifícios mais notáveis da cidade de Paris. Construído em 1778 por um jovem arquitecto chamado Firmin Perlin, o palácio não recebeu o nome do seu proprietário, Jean-Joseph de Laborde, um banqueiro e investigador de grande talento, mas sim do seu primeiro ocupante, que obteve o usufruto do local: Florimond-Claude, conde de Mercy-Argenteau, indivíduo de grande influência, que organizou o casamento do futuro rei francês Luís XVI com Maria Antonieta. Confidente e conselheiro da jovem rainha francesa, tentou moderar o seu estilo de vida exuberante e o seu gosto pelo luxo, mas em vão. Antes de fugir para Varennes, a rainha confiou-lhe um cofre com as suas jóias. E o cofre sobreviveu! Não é, portanto, a primeira vez que o edifício vê o seu destino entrelaçado com o do mundo da joalharia. Do esplendor do Antigo Regime, apenas restam o salão de cerimónias, com a sua colunata coríntia e paredes brancas ornamentadas com guarnições de madeira dourada, e a sala de jantar, ambos designados monumentos históricos. Após a Revolução, o prestigioso edifício sofreu inevitáveis modificações arquitectónicas.
Os Grands Boulevards estavam na moda e todas as pessoas de Paris passeavam as ruas do bairro, atraídas pelos seus teatros, cafés e passagens cobertas. Nicolas Duchesne, comerciante de selas e carruagens, adquiriu o Hôtel de Mercy-Argenteau aos herdeiros Laborde como um investimento.
Para aumentar o espaço, a família Duchesne acrescentou três pisos, incluindo dois pisos de sótão. O magnífico jardim adjacente à mansão e o seu terraço elevado foram substituídos por uma segunda propriedade de investimento. O bairro desenvolveu-se rapidamente. No entanto, era preciso notar que alguns dos apartamentos eram habitados por artistas de talento. O compositor francês François-Adrien Boieldieu escreveu uma das suas óperas populares, “La Dame Blanche”, no Hôtel de Mercy-Argenteau antes de ser representada na “Opéra Comique” do mesmo modo, o compositor italiano Rossini escreveu” Viaggio a Reims” no local em 1825, para a coroação de Carlos X. Durante o Segundo Império, o edifício pertenceu a uma companhia de seguros. As suas sumptuosas salas de recepção foram alugadas a vários clubes de jogo, cujos membros jogavam “whist” e dominó, liam os jornais e jantavam no local. Uma sala era dedicada ao xadrez e outra ao bilhar. O director do Grand Cercle era um antigo negociante que tinha feito negócios na América do Sul. Em 1891, com vista a acolher com pompa a União Latina Franco-Americana, confiou a criação de um salão de banquetes a Henri Fernoux, arquitecto conhecido por ter construído cerca de trezentos edifícios.
A decoração resultante é tão extravagante que muitas vezes se pensa que é obra de Charles Garnier, arquitecto da Ópera de Paris. É aqui, nestes grandes espaços sob as insígnias do Equador, do Uruguai, da Bolívia e das Honduras, que a L’Ecole des ArtsJoailliers, irá apresentar as suas exposições.
Jóias de Palco: A Grande Ilusão
Dada a sua localização no bairro dos teatros, parecia natural que o Hôtel de Mercy-Argenteau apresentasse a primeira exposição temporária da L’Ecole des ArtsJoaillier na sua nova sede, com o nome: “Jóias de Palco da Comédie-Française”. Esta mostra sem precedentes inclui 120 acessórios, obras de arte e documentos provenientes, na sua maioria, das colecções do teatro. Como introdução, é apresentado um excerto filmado da célebre peça de Georges Feydeau, “Un Fil à la Patte”, em que um anel está no centro de um mal-entendido. De facto, uma peça de joalharia pode conduzir à acção de um enredo! Graças a esta peça, que a exposição começa com uma nota humorística.
As duas primeiras secções decorrem em salas escuras que transportam o visitante para os bastidores, onde pinturas, guaches, miniaturas, gravuras, manuscritos e facturas de fornecedores recordam os primeiros tempos da “Comédie-Française”.
Acerca exposição, Agathe Sanjuan, directora da biblioteca-museu da Comédie-Française e curadora da exposição, explica: “Os conjuntos de jóias usados pelos actores pertenciam-lhes pessoalmente. Ao exibirem as suas jóias em palco, estavam também a mostrar o seu estatuto social. Mesmo que isso significasse contradizer a acção da peça! A verdade histórica só se impôs no final do século XVIII”. As peças que tinham um papel no enredo, no entanto, eram fornecidas pelo teatro. Durante o Primeiro Império, a joalharia de cena foi influenciada pelo gosto contemporâneo pela antiguidade, como demonstra a coroa de louros em metal dourado usada pelo grande Talma em “Britannicus”. A peça era duplamente significativa, pois foi um presente de Napoleão, de quem o actor era próximo, para o felicitar pelo seu desempenho no papel de Nero. Os visitantes passam por uma cortina de veludo preto antes de entrarem num espaço bem iluminado que faz lembrar o palco. As silhuetas dos actores e actrizes são projectadas em painéis iluminados como sombras de marionetas, acentuando o efeito teatral da cenografia. A atenção centra-se no romantismo e na tragédia de Rachel, heroína da época. “Nascida no seio de uma família de pobres mercadores viajantes, teve uma carreira deslumbrante. Depois de entrar para a Comédie-Française em 1838, foi convidada a actuar em todas as cortes europeias e até nos Estados Unidos”, explica Agathe Sanjuan.
Infelizmente, a saúde de Rachel era frágil e morreu de tuberculose aos 36 anos. Mademoiselle Rachel era apaixonada por jóias, tanto verdadeiras como falsas. Na cena de Phèdre, mudava de conjunto de jóias em cada acto, e em Bajazet, aparecia coberta de pedras do turbante ao cinto. O orientalismo estava em voga e o seu punhal, cravejado de pedras coloridas, é suficiente para evocar o esplendor do seu traje. Terão estes acessórios sido concebidos para brilhar ao longe? Quando vistos de perto pela primeira vez, deslumbram o espectador com a delicadeza do seu design. Podem não ser reais, mas a técnica utilizada é verdadeiramente extraordinária! A elaboração de certos ornamentos, como o diadema com estrelas montadas em molas para que tremessem e o conjunto de jóias de vidro e cristal azul – transformável como uma joia preciosa – composto por brincos e um colar cujo elemento central podia ser solto para ser usado como pendente, foi inspirado na alta joalharia.
Quando os visitantes entram no célebre salão de banquetes, a exposição atinge o seu
auge e outras surpresas aguardam-no. Trajes sumptuosos emprestados pelo
do “National Center for Theatrical Costume and Design” incluem um vestido bordado com pedras usado por Julia Bartet em 1888 na comédia moderna Pepa e a túnica adornada com um volumoso peitoral de cabochões de vidro que foram montados numa folha de alumínio para brilharem ainda mais, usada por “Mounet-Sully” na “Athalie” de Racine. Estes artistas eram “monstros sagrados”, como Jean Cocteau chamava aos actores que o impressionaram quando era jovem.
A última sala apresenta os intérpretes da “Belle Époque”, Mademoiselle Bartet, Édouard de Max e Sarah Bernhardt e retratos monumentais em forma de fotografias a preto e branco com três metros de altura revelam a sua presença imponente no palco.
O Hôtel de Mercy-Argenteau representa a nova casa de L’ Ecole, um espaço lindíssimo onde as peças de joalharia irão brilhar através das suas pedras cintilantes.
A nova exposição organizada pela L’École des Arts Joailliers mergulha-nos num mundo surpreendente de fantasia e ilusão, com cerca de uma centena de peças e arquivos das colecções da “Comédie Française”.
Bem-vindo ao mundo espetacular da joalharia de palco!
Theresa Beco de Lobo