A Arte do Ouro I 3.000 Anos de Tesouros Chineses
A L’ÉCOLE School of Jewelry Arts no Dubai Design District apresenta a sua primeira exposição ” A Arte do Ouro: 3000 Anos de Tesouros Chineses”, até 10 de Agosto. O evento oferece uma visão única da notável história da ourivesaria chinesa e, ao mesmo tempo, celebra a grande abertura do campus da L’ÉCOLE no Dubai. A exposição exibe uma centena de obras-primas da Colecção Mengdiexuan, uma das colecções de arte privada de Betty Lo e Kenneth Chu, uma das mais extraordinárias de Hong Kong, com peças que remontam a três mil anos.
A colecção foi anteriormente apresentada na L’ÉCOLE School of Jewelry Arts, em Paris, em Dezembro de 2022, e agora ocupa o centro do palco no Design District do Dubai, um centro dedicado à promoção e ao fomento das indústrias criativas no Dubai. O evento não só apresenta peças deslumbrantes, mas também proporciona informações sobre o contexto cultural e tecnológico do artesanato em ouro chinês, educando os visitantes sobre as suas origens.
A mostra: “A Arte do Ouro: 3.000 Anos de Tesouros Chineses”, leva os visitantes numa viagem pela história e geografia da joalharia ao longo da antiga Rota da Seda.
A exposição está instalada num espaço luminoso e destaca a forma como o ouro encantou o mundo durante milénios. Embora as jóias em ouro tenham raízes nas culturas do antigo Egipto e da Mesopotâmia, elas chegaram à China entre 3.000 e 4.000 anos atrás, quando os artesãos percorriam as mesmas rotas que os comerciantes da Rota da Seda. Algumas das peças mais antigas são do norte da China, como um colar em ouro martelado e uma coroa, mostrando a influência distinta do povo nómada célebre pelo seu ouro e pelos seus cavalos, que se espalharam por toda a Ásia Central até as margens do Mar Negro. Na época em que a China foi unificada sob as dinastias Qin e Han, o “status” do ouro era como a personificação de riqueza e de poder.
Betty Lo e Kenneth Chu começaram a coleccionar objectos preciosos há mais de 30 anos na sua galeria em Hollywood Road, uma das ruas mais antigas de Hong Kong e ainda célebre pelos seus antiquários. Quando receberam de presente um espelho de bronze no aniversário de casamento, o casal começou a coleccionar peças em bronze antes do seu interesse pelo ouro e outros ornamentos de metal precioso no seu acervo.
“Não fomos à caça ao tesouro”, disse Kenneth. Em vez disso, eles foram atraídos pela criatividade de como as pessoas usavam esses belos objectos. Ao reunir o seu património, olharam para a beleza, a autenticidade e a condição de cada material.
Lo e Chu trabalharam em estreita colaboração com académicos e usavam exposições como esta, como uma experiência de aprendizagem. Esta mostra é o seu nono acontecimento numa galeria desde 1990, as suas exposições viajaram pela China continental e à volta do mundo.
A mostra: “A Arte do Ouro: 3.000 Anos de Tesouros Chineses”, salienta o caminho que a joalharia seguiu de oeste para leste utilizando técnicas, como martelar, fundir, filigranar e granular. O período da Colecção Mengdiexuan, vai desde o final da Dinastia Shang, por volta de 1600 a.C., até a Dinastia Ming, de 1368 a 1644, abrangendo a evolução do ouro como um papel central na civilização chinesa.
A colecção Mengdiexuan começou com um presente de casamento de um espelho de bronze do pai de Lo. A colecção teve início nos anos 1980, colocando-os na pesquisa de descoberta na metalurgia chinesa e no ouro. Segundo Chu, eles foram atraídos pela criatividade dos objectos de ouro, estimulada pelo facto do ouro ser usado na cultura chinesa principalmente em objectos e ornamentos pessoais. “Não procuramos uma arca do tesouro”, disse ele, à medida que os seus interesses do acervo evoluíram de objectos de bronze para ouro e metais preciosos. “
Lo e Chu, Investigadores intensos, enquanto trabalhavam com negociantes e académicos, visitavam museus e, por mais de 30 anos, eles próprios tornaram-se os maiores especialistas mundiais no campo da ornamentação do ouro chinês.
Essa abordagem também revela a história de como a metalurgia do ouro foi introduzida na cultura chinesa, uma vez que cada uma dessas técnicas chegou à China em momentos diferentes e foram adoptadas em diversas partes da paisagem cultural e geográfica do país. O trabalho em metal dourado foi inicialmente uma importação que reflectia o envolvimento activo da China com culturas estrangeiras. Nas últimas dinastias, entretanto, o ouro integrou-se ao design chinês e tinha pouca semelhança com o ouro da Europa medieval ou renascentista. A iconografia originalmente compartilhava características com o ouro europeu antigo, como animais e cenas de caça, mas na Dinastia Song (960–1279) e na Dinastia Ming (1368–1644), apresentava detalhes comuns às pinturas chinesas, jade e porcelana, como flores, morcegos e dragões.
Lo e Chu construíram o seu património em torno das inspirações das diversas culturas que influenciaram a China ao longo dos milénios, da Mongólia e Tibete e ainda aos antigos nômades Xiongnu. O nome da colecção, Mengdiexuan, que em português é “Pavilhão das Borboletas”, faz referência directa a uma anedota de Chuang Tzu. O sábio, místico e contemporâneo de Confúcio, sonhou que era uma borboleta, mas perguntou se possivelmente a borboleta estaria a sonhar com ele. Embora a exposição apresente apenas uma pequena parte da sua colecção, conta uma história, neste caso sobre a diversidade da civilização chinesa primitiva, onde alguns dos imperadores determinavam o uso de trajes nómadas e usavam jóias em ouro com desenhos que apresentavam as estepes selvagens da Ásia Central.
A introdução da joalharia em ouro na China ocorreu um a dois mil anos após a sua primeira aparição na Ásia Menor, Egipto e Mesopotâmia no quarto e quinto milênios a.C. Nos seus primeiros usos na China, nas dinastias Xia e Shang, um período de quase 1.000 anos de 2079 a 1122 a.C., o ouro foi martelado em folhas e usado principalmente como incrustação decorativa em vasos rituais de bronze que estavam entre os principais símbolos de status e potência. Antes da idade do bronze na China, os objectos de jade ocupavam posição de destaque na sociedade chinesa e, apesar da sua popularidade, o ouro permaneceu como perpétuo e em segundo lugar do jade como símbolo de status ou luxo.
Os primeiros exemplares da Arte do Ouro estão entre os mais antigos da exposição e apresentam a técnica de martelar, mas também num período em que a cultura nómada e pastoral dos Xiongnu e de outros pastores e cavaleiros detinham a criatividade chinesa. Os brincos giratórios em placa de ouro da Dinastia Shang eram semelhantes aos brincos do povo Rong-Di da periferia da China, embora encontrados em outros túmulos da época.
De destacar outra peça antiga, como a coroa em ouro associada à nobreza Xiongnu. Este objecto existia na China imperial confucionista, mas migrou para outras partes do mundo sino-centrico, particularmente a península coreana, onde o reino Silla produziu elaboradas coroas douradas que mostram uma ligação visual aos chapéus ornamentais do património Mengdiexuan.
Mas embora esses exemplares relativamente simples com a técnica de martelar fossem do período inicial das jóias em ouro, na Dinastia Tang (618-907) e transformados em peças de grande delicadeza e luxo. Quase metade dos exemplares expostos são martelados de períodos posteriores. Na Dinastia Tang, o ouro passou a representar a virtude e o esplendor divino, o paraíso budista era visto como dourado. E a forma como o ouro era extraído, era observado como uma qualidade do Imperador Tai Zong (598-649), que elogiou o seu ministro por ser capaz de distinguir o “ouro” e refiná-lo. Muitas dessas peças continuavam a contar uma história de contacto com culturas estrangeiras, como torsos e selas de cavalo em forma de bolsa de prata dourada, uma referência aos cavalos Ferghana da Ásia Central que foram uma das primeiras importações importantes da China sob a Dinastia de Tang.
Uma segunda técnica artesanal apresentada na exposição, é a fundição, onde o metal líquido é derramado num molde para criar uma forma, foi intimamente associada à metalurgia do bronze que produziu vasos rituais magníficos da era Shang a Han.
Mas onde a ourivesaria chinesa atingiu o seu apogeu foi com o fio de ouro e a filigrana, técnicas que se originaram no Mediterrâneo por volta de 2.000 a.C., estas peças tornaram-se moda na China durante a dinastia Tang, assim como durante os Song. Há decorações espirais em ouro apresentados na exposição que datam de muito antes, mas na Dinastia Ming, as criações de filigrana em ouro eram usadas para captar a vida e o movimento, como um delicado gancho de cabelo em ouro com um dragão perseguindo uma pérola ou em forma de cigarra em ouro com incrustações de turmalina.
A técnica final apresentada na exposição, a granulação, é um processo de confecção de grânulos de ouro que são usados como decoração, juntamente com incrustações de outros materiais. Entre as jóias de preferência dos colecionadores, sobressai um pente em ouro com incrustações de pedras preciosas, vidro e concha contra um fundo granulado. Além do pente salienta-se uma placa de toucado e outra extremidade do pente em ouro, que apresentam desenhos elaborados em relevo usando granulação. A técnica estava disponível para os artesãos chineses já no período Han Ocidental e esteve na moda desde então até à dinastia Tang, com exemplos como a extremidade do pente em ouro e a placa de toucado. A própria técnica de granulação foi perdida no século XX.
Todo o ambiente do evento atrai o espectador a olhar para as lindas jóias expostas no seu contexto cultural e tecnológico, convidando-o a ver como os “criadores” conceberam exemplares tão delicados e fascinantes. Esta mostra, foi montada com tanta harmonia, afastando-se da curadoria tradicional, apresentando então uma organização admirável, que se inicia com a assinatura atraente das peças e a investigação apurada da natureza do ouro.
Theresa Beco de Lobo