“Solid Gold” I uma Extravagância Áurea

“Solid Gold” I uma Extravagância Áurea

“Tudo, desde a moda, à arte contemporânea e às joias antigas, tem o toque de Mestre nesta sumptuosa (e muito brilhante) exposição”.

Como material e cor, o ouro tem simbolizado beleza, honra, alegria, ritual, espiritualidade, sucesso e riqueza durante toda a história da humanidade. O metal sedutor foi transformado em inúmeras formas – de representações milenares de um mundo idealizado a retábulos italianos dos séculos XIII e XIV, de telas japonesas a moda de alta costura, joias únicas e esculturas contemporâneas. Por ocasião do seu 200.º aniversário, o Brooklyn Museum apresenta a exposição singular “Solid Gold”, dedicada ao elemento que inspirou inúmeras obras de arte, moda, cinema, música e design. A exposição até 6 de Julho de 2025 tem a curadoria de Matthew Yokobosky, curador sênior de moda e cultura material, com Catherine Futter, directora de questões curatoriais e curadora sênior de artes decorativas, e Lisa Small, curadora sênior de arte europeia do Brooklyn Museum.

Acerca da exposição, o curador sênior de moda e cultura material do Brooklyn Museum, afirmou: “Solid Gold transportará os visitantes através dos muitos mundos do ouro, das suas histórias alegres, embora por vezes desoladoras, e das suas inúmeras expressões luminosas em culturas passadas e presentes. Enquanto museu dedicado a unir a arte e as pessoas em experiências partilhadas, o público encontrará inspiração, abrindo-o a reinos inexplorados de beleza no seu mundo.”

Em 2018, a NASA lançou a Parker Solar Probe, a primeira nave a voar através da atmosfera superior do sol. Ainda está lá em cima, orbitando o sol, aproximando-se cada vez mais, enfrentando – como diz o site da NASA – “calor brutal e radiação para fornecer à humanidade observações sem precedentes, visitando a única estrela que podemos estudar de perto”.

Um vídeo de cinco minutos do lançamento do foguetão para os céus é o primeiro ponto que se vê quando se entra na “Solid Gold”. Estas imagens encontradas deram o primeiro passo para uma exposição expansiva e alucinante dedicada ao metal precioso a que os Incas chamavam poeticamente “as lágrimas do sol”. Um par de trajes brilhantes e ofuscantes do designer belga Walter Van Beirendonck estão ali perto como sentinelas, são da sua colecção “Icarus” de 2023, que tem o nome da figura da mitologia grega que voou demasiado perto do sol.

Cerca de metade das 500 peças da exposição provêm da colecção do museu: moedas antigas, retábulos renascentistas, telas japonesas, vestidos de alta-costura cintilantes. Esta mostra milenar comemora o 200º aniversário do museu e constitui uma montra do seu vasto espólio. “Surgiu a ideia de fazer uma exposição sobre metade da colecção para o seu aniversário”, disse o curador sénior Matthew Yokobosky durante uma entrevista. “E tínhamos 4.000 obras que eram de ouro ou tinham um elemento de ouro.Mas esta não é uma exposição de levantamento simples. É livre, discursiva, vertiginosa: repleta de muitas ideias e peças cintilantes. É como olhar para o sol”, disse Yokobosky. “O ouro vai ter sempre uma atracção primordial por nós. Podemos não ser capazes de verbalizar o porquê de ser tão deslumbrante, mas está lá algures.” “Solid Gold” considera o tema em todas as suas permutações: como elemento, material, cor e símbolo de beleza, espiritualidade, riqueza e poder, mas também de ganância, arrogância e excesso.

A história – tal como o Museu de Brooklyn a apresenta, usando e renunciando à cronologia à sua discrição – começa há muito, muito tempo: quando os povos antigos descobriram estas manchas amarelas brilhantes nos leitos dos rios e ribeiros. Foram precisos milhares de anos de erosão da rocha pela água para produzir estas partículas de ouro, mas para os seus primeiros adeptos, deve ter parecido magia.

Os antigos egípcios acreditavam que era a “carne dos deuses”. A maior parte da primeira galeria da exposição centra-se na obsessão egípcia pelo ouro, abrangendo tanto artefactos genuínos, como uma múmia adornada com correntes de ouro, como homenagens contemporâneas.

De destacar a Grelhas Douradas do joalheiro Gabby Elan da década de 2000, mas os trajes de John Galliano para a Egiptomania, em lamé e lurex, que desenhou para a Christian Dior em 2004, um vestido comprido do Balenciaga de 2020 assemelha-se a um invólucro amassado de Ferrero Rocher.

A sala seguinte ensina aos espectadores de onde vem o ouro, as várias formas (lucrativas, muitas vezes exploradoras e perigosas para o ambiente) de o extrair e como os ourives e artesãos trabalham com ele. “Pode fazer-se muito com um pouco de ouro”, disse Yokobosky. “Dura para sempre. Não mancha. Não enferruja. Podemos bater-lhe e ele não fica quebradiço. É maleável. E tem tantos significados”.

Ainda assim, o metal esteve sempre associado às  convicções divinas. Os hindus faziam esculturas das suas divindades em ouro. Os muçulmanos adornavam as suas mesquitas e artefactos religiosos com este metal. Os cristãos eram inicialmente cépticos em relação ao material, mas depois usaram folha de ouro para dar aos seus altares e imagens sagradas um brilho celestial. Alguns sacerdotes católicos usavam vestes com tecidas com fios de ouro, para assinalar o seu estatuto divino. Existe um espantoso exemplo bordado de meados do século XVIII. Na idade das trevas, o ouro proporcionava, de facto, brilho e entretenimento. Cálices reluzentes, retábulos cintilantes e livros de orações iluminados tornavam as idas à igreja muito mais interessantes.

Os artistas contemporâneos têm brincado com associações religiosas do ouro de forma profunda, por vezes revolucionária. O pintor Titus Kaphar, por exemplo, usa folha de ouro nos seus retratos luminosos de homens negros, pintando-os como ícones cristãos bizantinos. Um dos seus dípticos é apresentado em “Solid Gold”, pendurado numa sala escura repleta de pinturas religiosas em ouro da Itália renascentista. Mais à frente, depois de várias salas dedicadas ao ouro na moda, numa galeria branca, destaca-se a escultura de ouro de 28 quilates de Marc Quinn de Kate Moss numa pose de ioga em forma de pretzel (Siren) está entre uma série de esculturas de Buda – um novo ícone para a nossa cultura cada vez mais adoradora de celebridades.

A relação entre arte e moda é um tema contínuo na exposição. Gareth Pugh, cuja colecção de Outono/Inverno 2011-12 incluía peças cobertas com pequenos azulejos metálicos laminados dourados que se inspiravam no design de microchips e sugeriam uma sensação de movimento quase pixelizada, é frequentemente visto como ultrapassando a fronteira entre arte e performance. Noutros locais, encontramos uma colaboração entre a artista Peggy Slinger e a directora criativa da Dior, Maria Grazia Chiuri, para a colecção Outono/Inverno 2019-20: uma réplica em folha de ouro, do tamanho de uma casa de bonecas, do showroom original da Dior na Avenue Montaigne, 30, em Paris, que transforma o utilizador numa versão viva da “Femme Maison” de Louise Bourgeoise.

Através desta mostra pode-se sentir que a Moda cada vez mais está ligada à Arte.

“A moda é uma forma de arte? Sim, Zandra Rhodes disse: “Penso que a moda é uma forma de arte – pode chamar-lhe arte decorativa ou aplicada, ao contrário de belas-artes, mas qual é a diferença? Porque a mesma quantidade de expressão artística está presente no vestuário, numa peça de cerâmica ou numa pintura. Se um museu apresentar um traje é porque penso que se trata de uma forma artística que deve ser recordada”.

Theresa Beco de Lobo

Theresa Bêco de Lobo

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